Algoritmo da Observação

Na clássica obra “1984”, de George Orwell, a teletela é um dispositivo omnipresente de vigilância. Sendo como um algoritmo da observação, seriam as redes sociais a Teletela imaginada por Orwell, mas ainda sem um viés político tão grande sobre nossas vidas? 

Sobre as Teletelas do livro, eram (serão?) ao mesmo tempo uma janela e uma prisão; um olho que tudo vê, mas sem ser questionado. Hoje, mais de 70 anos depois da publicação, não temos teletelas fixadas em nossas paredes, mas temos uma ferramenta de controle quase tão poderosa: os algoritmos das redes sociais. Eles observam, categorizam, influenciam, e, em muitos casos, parecem saber mais sobre nós do que gostaríamos de admitir.

Algoritmos e Vigilância Pessoal

A função dos algoritmos das redes sociais é personalizar a experiência online de cada usuário, mas até que ponto essa personalização realmente nos serve? Diferente de uma teletela visível e conhecida, o algoritmo opera em segundo plano, adaptando o conteúdo para manter nossa atenção. E ele faz isso observando cada interação: o tempo que passamos em cada post, os likes, os comentários, as reações, as pausas nos vídeos. Cada clique é uma informação adicionada ao “perfil” que essas plataformas têm de nós. Assim, o algoritmo se torna, de certa forma, nosso supervisor, ajustando o que vemos e quem vemos – e, gradualmente, influenciando o que pensamos.

O poder invisível do algoritmo é uma versão moderna e silenciosa da teletela. A diferença? Podemos chamar de algoritmo da observação e reação, pois, não apenas nos vigia; ele reage e influencia, inserindo sutilmente o conteúdo que ele “acredita” que queremos ver. O mais surpreendente é que, ao contrário da teletela, muitas vezes aceitamos essa vigilância como algo natural ou até desejável.

Como os Algoritmos “Sabem” Tanto Sobre Nós?

O processo pelo qual os algoritmos constroem perfis é quase imperceptível, mas bastante invasivo. Ao traçar um paralelo com a teletela, temos que lembrar que, ao final, ela era o símbolo máximo de poder do Partido. No caso das redes sociais, esse poder não está nas mãos de um regime totalitário, mas de corporações que, sem prestar contas diretamente ao usuário, buscam maximizar o engajamento para lucro próprio. Isso nos coloca em um papel quase submisso ao que o algoritmo nos entrega, porque ele aprende com cada interação e refina continuamente nossa “bolha”.

É comum ver o algoritmo como uma ferramenta neutra de personalização, mas é preciso lembrar que ele tem uma intencionalidade própria: fazer com que passemos o máximo de tempo possível na plataforma. No final, esse interesse de manter a atenção gera um tipo de “perfil psicológico” que não apenas identifica nossos interesses, mas nossos medos e vulnerabilidades.

A Criação de um Novo “Eu”

Na ficção de Orwell, os personagens vivem com uma autoconsciência que molda até seus pensamentos, sempre monitorados. Hoje, nas redes sociais, os algoritmos podem influenciar como construímos nossa identidade e nossa percepção da realidade. Como a teletela moldava a visão de mundo dos personagens de 1984, o algoritmo molda a nossa, mas de uma forma ainda mais personalizada. Ao invés de forçar um discurso único, ele nos oferece apenas o que mais nos interessa, criando o que se chama de “bolhas de informação”.

Isso pode parecer inofensivo, mas pense nos efeitos a longo prazo: ao filtrar o que consumimos, o algoritmo pode reduzir nossa capacidade de empatia, limitando a exposição a opiniões diversas e alimentando um ciclo de confirmação de crenças. Com o tempo, o nosso senso de identidade pode ser moldado por uma percepção de realidade que é enviesada pelo próprio algoritmo.

Resignação e Resistência

Então, qual é o nosso papel nessa relação com o algoritmo? Nos acostumamos tanto a esta vigilância silenciosa que, como no caso da teletela, passamos a vê-la como uma parte inevitável da vida moderna. Assim como o personagem Winston de 1984, muitos de nós percebem o controle, mas se veem incapazes de resistir ao fluxo constante de informação e vigilância.

Há, porém, formas de resistência. A conscientização é a primeira. Entender que o algoritmo é uma ferramenta de manipulação que responde a objetivos comerciais é um passo para evitar o conformismo. Outra ação é diversificar conscientemente nossas fontes de informação, permitindo que possamos ver além da “bolha” que nos é imposta.

Assim, enquanto a teletela de 1984 representava a submissão total do indivíduo ao poder, o algoritmo da observação, reação e o que mais as grandes empresas quiserem nos oferecer, têm a capacidade de moldar nossas percepções de forma sutil e silenciosa, mas ainda há espaço para questionamentos e escolhas. Faça a sua.

Caso não tenha lido ainda está obra, fica a indicação, adquira na Amazon, clicando aqui.

Rolar para cima